Imagine um computador que não depende apenas de chips de silício, mas de neurônios humanos vivos, cultivados em laboratório, para processar informações. Essa visão futurista deixou de ser ficção científica e se tornou realidade com o lançamento do CL1, o primeiro computador biológico comercial do mundo, desenvolvido pela empresa australiana Cortical Labs. Anunciado em março de 2025 durante o Mobile World Congress em Barcelona, o CL1 marca o início de uma nova era na computação, onde biologia e tecnologia se fundem para criar o que a empresa chama de Inteligência Biológica Sintética (SBI).
Com promessas de revolucionar áreas como medicina personalizada, pesquisas neurológicas e desenvolvimento de medicamentos, o CL1 também levanta questões sobre o futuro da inteligência artificial (IA) e da interação entre humanos e máquinas. Mas como exatamente esse “cérebro em uma caixa” funciona? E o que ele significa para o nosso futuro?
Como funciona o CL1?
O CL1 é um sistema híbrido que combina neurônios humanos cultivados a partir de células-tronco (provenientes de sangue, pele ou outras amostras) com hardware de silício, criando uma rede neural viva capaz de aprender e se adaptar em tempo real. Diferente dos computadores tradicionais, que operam com circuitos fixos, o CL1 utiliza biochips — placas de eletrodos onde os neurônios crescem e formam conexões dinâmicas. Esses neurônios são mantidos vivos por até seis meses graças a um sistema de suporte vital integrado, que regula temperatura, oxigênio e nutrientes.
O segredo da operação está no Biological Intelligence Operating System (biOS), um software proprietário que simula um ambiente digital para os neurônios. Por meio de impulsos elétricos enviados e recebidos pelos 59 eletrodos do biochip, o sistema permite que os neurônios “percebam” esse mundo virtual e respondam a ele, ajustando suas conexões de forma autônoma — um processo que imita o aprendizado neural humano. “É como um corpo em uma caixa”, descreveu Brett Kagan, diretor científico da Cortical Labs, em entrevista à New Atlas.
Principais elementos do funcionamento do CL1:
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Neurônios vivos: cultivados a partir de células-tronco humanas.
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Biochips: conectam neurônios ao hardware com 59 eletrodos.
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biOS: software que traduz sinais elétricos em aprendizado.
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Eficiência: consome entre 850 e 1.000 watts por rack de 30 unidades — uma fração da energia usada por data centers de IA tradicionais.
Essa combinação de baixo consumo de energia e alta capacidade de auto-organização o diferencia radicalmente dos sistemas de IA baseados exclusivamente em silício.
Uma revolução na medicina e além
A Cortical Labs aposta que a Inteligência Biológica Sintética do CL1 terá impacto imediato em várias áreas. Na medicina personalizada, o sistema permite que pesquisadores cultivem neurônios a partir de células de pacientes específicos, criando modelos vivos para estudar doenças neurológicas como Alzheimer e Parkinson. Isso pode acelerar o desenvolvimento de medicamentos, oferecendo dados mais relevantes sobre como compostos afetam o cérebro humano — uma vantagem ética e científica sobre testes em animais.
“Podemos simular processos neurológicos em nível molecular e observar como genes e proteínas influenciam o aprendizado”, explica Kagan. Além disso, sua capacidade de adaptação abre portas para avanços em robótica, enquanto a pegada de carbono reduzida — comparada aos milhares de megawatts-hora consumidos por data centers de IA — alinha o CL1 aos apelos por tecnologias sustentáveis.
Principais benefícios:
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Medicina: modelos personalizados para doenças neurológicas.
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Farmacologia: testes de drogas mais rápidos e éticos.
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Sustentabilidade: menor consumo energético que a IA tradicional.
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Robótica: sistemas adaptativos para máquinas inteligentes.
“Estamos combinando o melhor da biologia com o poder do silício”, afirma Hon Weng Chong, fundador e CEO da Cortical Labs.
Cortical Cloud e o Cérebro Mínimo Viável
O CL1 não é apenas um produto físico — vendido por cerca de US$ 35.000 por unidade, com entregas previstas para meados de 2025 —, mas parte de uma visão maior. A Cortical Labs planeja lançar a Cortical Cloud, uma plataforma de “Wetware-as-a-Service” (WaaS) que permitirá a pesquisadores de todo o mundo acessar biocomputadores remotamente. “Queremos democratizar essa tecnologia”, diz Chong.
Outro projeto ambicioso é o Cérebro Mínimo Viável (MVB), um sistema neural controlado capaz de processar informações complexas com o mínimo de diferenciação celular desnecessária. Esse conceito, ainda em fase inicial, pode ser a base para biocomputadores ainda mais avançados.
Próximos passos da Cortical Labs:
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Cortical Cloud: acesso remoto a biocomputação.
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Cérebro Mínimo Viável: redes neurais otimizadas.
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Escalabilidade: expansão para laboratórios globais.
Créditos: Divulgação/Cortical Labs
Desafios e questões éticas
Apesar do entusiasmo, o CL1 enfrenta desafios. Manter neurônios vivos exige condições precisas, e sua vida útil de seis meses levanta questões sobre escalabilidade. Além disso, a tecnologia é nova, e seu potencial só será totalmente revelado com uso amplo.
As implicações éticas também são inevitáveis. Embora os neurônios do CL1 não apresentem consciência, o uso de células humanas em computação gera debates sobre sentiência potencial e limites biológicos. A empresa afirma trabalhar com bioeticistas para garantir responsabilidade e segurança.
Desafios em destaque:
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Técnicos: vida útil limitada dos neurônios (6 meses).
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Éticos: uso de células humanas em máquinas.
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Práticos: escalabilidade para uso em massa.
O futuro da computação: chips ou células?
O CL1 é um marco que nos faz repensar o que significa “computar”. Desde 2022, quando a Cortical Labs ensinou 800 mil neurônios humanos e de ratos a jogar Pong com o sistema DishBrain, a empresa vem refinando sua visão. O CL1 é o resultado: um dispositivo comercial que prova o conceito e o torna acessível.
Estamos entrando em uma era onde chips de silício podem dar lugar a células vivas? “A biologia é a base da inteligência generalizada”, diz Chong. “Se queremos máquinas que pensem como nós, por que não usar os mesmos blocos de construção?” No X (antigo Twitter), usuários destacam o potencial do CL1 para “redefinir a IA” e “tornar a computação mais verde”.
O que define essa nova era:
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Passado: DishBrain jogando Pong em 2022.
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Presente: CL1 como produto comercial em 2025.
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Futuro: biologia superando o silício em eficiência.
E você, leitor, como vê essa fusão entre biologia e IA? Será ela a chave para uma revolução tecnológica mais humana e sustentável, ou apenas o primeiro passo em um caminho cheio de incertezas? Comente abaixo e junte-se ao debate sobre o futuro que está sendo construído — célula por célula.